Carlos Santana
19.maio.1999
Tania Menai, de Nova York
Não tem pra ninguém. Quando se pensa em World Music ou Woodstock,Carlos Santana é um dos primeiros nomes que vem à cabeça. Desde começou sua carreira, ao deixar o México rumo a São Franscisco, ele vendeu mais de 40 milhões de cds e tocou ao vivo para 20 milhões de pessoas. Em 1998, Santana entrou para o Rock and Roll Hall of Fame. Seu novo álbum, SuperNatural, lançado em junho de 1999 no mercado americano, e que lhe rendeu o Grammy, conta com nomes como Eric Clapton, Rob Thomas, Lauryn Hill, Dave Mathwes, Everlast, Mana e Eagle Eye Cherry. Em sua mais nova turnê pelos EUA, Santana aproveitou a estada em Nova York para bater um papo com a Bravo.
O que você acha da nova era de música digital, onde computadores substituem instrumentos?
Acho a música digital ok, mas minha primeira opção seria os sentimentos e o ato de tocar um instrumento. Nada pode substituir o “cordão umbilical” - quando tocamos somos capazes de deixar as pessoas arrepiadas. Computadores não fazem isso, eles são superficiais. Por exemplo, uma foto minha não sou eu; é apenas uma pequena parte de mim. Quando você quer conhecer uma pessoa é necessário que você visite sua casa, coma da sua comida, experimente seu ambiente. Através de uma foto é impossível conhecê-la por completo. O mesmo acontece com a música. Existe uma maneira mais profunda e natural de se conectar com o ouvinte. E a melhor forma não é por meio do computador ou sintetizadores. Assim como Picasso usava elementos da África ou de cadeiras quebradas, há sempre fundamento na mistura de coisas diferentes para um determinado fim e quando há equilíbrio.
A geração eletrônica sabe entender a música?
A música é como as formas de uma mulher: tem curvas. Temos de respeitar todas as suas partes. O que faz da música encantar tanto jovens quanto pessoas as mais velhas é a dinâmica e os contrastes - suavidade e intensidade. Tudo bem se alguns curtem música robótica germânica. O meu gosto é mais envolvente por que experimentei mais. Como viajo muito, conheci música balalaica e de dança do ventre, capoeira, mali bali, e instrumentos do Kênia ou Japão. Para mim a música tem de ser verdadeira. Caso contrário eu a deixo de lado. Mas uma outra pessoa vai acabar gostando - tem gosto para tudo. Não há música boa ou ruim, mas eu não gosto de música mecânica.
O que é essencial para a moçada que está começando uma banda?
Eles devem prestar atenção às emoções em primeiro lugar. Segundo Albert Einstein, “a imaginação é mais importante do que o conhecimento”. Os sentimentos são muitos importante para a música. Sem eles, só se produz um belo som, mas não se toca o coração de quem o escuta. Por isso, mais importante do que qualquer corda sofisticada, é fundamental aprender a transmitir suas emoções. Não saia de casa até que você tenha a sua própria música. Isso não quer dizer que você não deva aprender dos outros, pelo contrário, eu aprendi música com várias pessoas, mas eu tenho meu estilo. É importante descobrir suas impressões digitais.
Além do rock, há alguma outra música pela qual você é apaixonado?
Aprendi de tudo, mas a minha primeira paixão foi o blues, “the real
thing”, uma música despida. É a pura essência da música. Depois que
você sabe blues, você pode ir para favela ou qualquer bairro popular do mundo, adicionar os diferentes ritmos e se sentir em casa.
Quais são os três CDs que não podem faltar no seu cdplayer?
Exodus do Bob Marley, What’s going on de Marvin Gaye, e qualquer um dos três álbuns do Jimmy Hendrix.
Você vai participar do próximo Woodstock , que acontece na segunda metade de julho em Rome, estado de Nova York ?
Eles me convidaram para tocar, mas acho que não vou. O convite foi
feito para abrir ou fechar o festival com outros músicos em tributo ao Jimmy Hendrix. Mas eu só toco se for com a minha banda. Minha paixão é tocar com a minha banda pois temos um propósito - claro que poderia dar uma canja com outros músicos, mas a banda é essencial.
O que você acha da música brasileira?
Excelente, ela tem um espírito muito poderoso. Ela é bastante
sofisticada - Tom Jobim, Elis Regina, Milton Nascimento - e tem a
música da favela. Não importa quão pobre eles sejam, eles são mais
ricos em espírito do que o magnata americano Donald Thrump. É
impossível comprar a alegria de um desfile de escola de samba, por
exemplo. Para o Brasil ganhar, o país tem que ter fome.
Qual o espírito do novo CD “Supernatural”, que lhe rendeu o Grammy?
Esse CD aconteceu de forma bem natural, por isso tem esse nome. Foi
bastante glorioso porque todos nós - Eric Clapton, Lauryn Hill, Wyclen Jean, Everlast, Rob Thomas, Mana, Eagle Eye Cherry, e Dust Brothers - queríamos a mesma coisa. Todos nós somos músicos, não pertencemos ao mundo do showbiz. Com esse trabalho, temos a intenção de colocar os jovens em contato com sua espiritualidade. Eles precisam hoje de mais compaixão e menos medo. É a partir do medo que nasce a brutalidade.
Como a música e cultura mexicana influenciou a sua obra?
A música mexicana tem muito da música alemã, turca e francesa. A
palavra “mariache”, vem de “marriage”, casamento em francês. O
casamento entre os músicos. A música mexicana de verdade é a pré-
colombiana, dos Astecas, Incas e outros índios. Os mexicanos ficam
bravos comigo quando digo que eles tocam música européia. Mas eu tive
muita influência de Agustín Lara, um Tom Jobim mexicano, autor de
canções como Besa me mucho. Meu pai me ensinou violino clássico, mas,
depois de muito tempo, o convenci que minha grande paixão era o rock.
O que você tenta transmitir por meio da música?
Eu tento apresentar diferentes menus para os ouvintes. Eles não
precisam pensar como eu, mas este menu pode transmitir paixão,
esperança, inspiração, motivação. O oposto do medo. É assim que somos conectados - como na acupuntura - pelo som, ressonância e vibração.
Som, ressonância e vibração alcançam as estruturas moleculares. Quando escutamos música, samba ou uma melodia como Oceano, de Djavan, você ri e chora ao mesmo tempo. A música nos faz lembrar que somos mais do que carne e osso - que somos espíritos multidimensionais.
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[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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