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Richard Nelson Bolles
01.março.2000

Está à procura "daquele" Emprego?

Fuja dos anúncios de jornais e mantenha distância do departamento de RH - é o que aconselha um grande mestre no assunto

Por Tania Menai

Na primeira vez em que foi dar um workshop sobre busca de empregos, Richard Nelson Bolles suava frio. Ele não sabia como achar assunto para preencher os três dias de duração do evento. Isso aconteceu no Canadá, 30 anos atrás. Hoje, aos 72 anos de idade, o autor de Qual É a Cor do Seu Pára-Quedas?, o livro mais vendido no mundo sobre procura de empregos, considera as duas semanas do seminário que ele dá anualmente nos Estados Unidos "muito pouco tempo". Desde que foi lançado, em 1970, e atualizado a cada ano pelo autor, o livro já foi traduzido para 11 idiomas e vendido para 6 milhões de pessoas no mundo todo. (No Brasil, foi lançado em 1998 pela Salamandra e, em março próximo, uma nova edição revisada será lançada pela Editora Sextante com o título Como Conseguir um Emprego e Descobrir a Profissão Ideal - Qual É a Cor do Seu Pára-Quedas?) Esse é, sem dúvida, o líder das prateleiras de um mercado que desde 1990, só nos Estados Unidos, publicou mais de 3 100 livros sobre como achar, administrar e caçar empregos.

Bolles é ministro da igreja episcopal - e deixa isso perfeitamente claro em seu estilo. Ele explica tudo com a calma de um professor. Seus cinco filhos seguiram as mais variadas carreiras - um deles, inclusive, é um profissional destacado na área de informática. De seu escritório, em Alamo, na Califórnia, Bolles concedeu a seguinte entrevista à VOCE s.a.

O que levou 6 milhões de pessoas a ler o seu livro?

Em primeiro lugar, acho que foi o fato de a busca de emprego ter uma grande importância na nossa sociedade e o fato de não existirem muitas escolas que nos ensinam sobre isso. Quando nos formamos, temos de escolher um bom parceiro e uma carreira que se encaixe nas nossas qualificações. Por isso existem enxurradas de livros sobre relacionamentos e carreiras. Na época em que escrevi o livro, existiam apenas 13 publicações sobre o assunto. Hoje existem milhares. Em segundo lugar, porque depois de tantos anos este livro já virou referência no assunto. E, em terceiro, talvez porque os leitores gostem da minha honestidade. Não tenho compromisso com ninguém, não pertenço ao setor, por isso tenho a liberdade de ser sincero.

O índice de desemprego nos EUA hoje é de 4%. Há quem tire a sorte para escolher entre três ofertas de trabalho. No Brasil a situação é outra: muitos profissionais qualificados têm dificuldade de construir uma carreira. Como lidar com isso?

A sobra ou escassez de emprego é cíclica em todos os países. A situação, tanto nos EUA quanto no Brasil, acabará se invertendo. A primeira coisa a se pensar é a questão geográfica. Milhares de pessoas mudam de cidade ou de país, pois acham que suas qualidades profissionais são mais valorizadas em algum outro lugar. A segunda coisa é esquecer os anúncios de jornais, porque as empresas anunciam somente em duas ocasiões: quando estão desesperadas atrás de mão-de-obra especializadíssima ou quando o trabalho não requer nenhum tipo de qualificação e é mal remunerado. O ideal é fazer a "entrevista de informação".

O que é "entrevista de informação"?

É procurar as empresas que interessam a você, mesmo que naquele momento não haja vagas. Investigue sobre elas e, se gostar, descubra quem é a pessoa que tem poder de decisão para contratá-lo. Há sempre alguém que conhece alguém que trabalha naquela empresa. Mais cedo ou mais tarde uma vaga aparecerá - alguém vai morrer, mudar de empresa ou casar. Eles vão precisar de uma pessoa com as suas qualidades. Então o importante é você estar por perto quando isso acontecer. Mas não tente entrar numa empresa pela porta dos recursos humanos.

Por quê?

Apresentar-se para o RH de uma empresa é suicídio. Para se ter uma idéia, apenas 15% das empresas americanas mantêm esse departamento. A função do RH é peneirar as pessoas para que elas não "incomodem" os escalões mais altos da companhia.

Como o senhor vê a chegada da Internet ao cenário da busca de empregos?

A Internet foi só uma mudança de roupa no sistema, ou seja, o processo continua o mesmo, mas ganhou uma cara nova. Enviar currículo sempre foi tido como uma forma precária de arranjar emprego. Você pode panfletar centenas de currículos e não receber sequer um telefonema. Daí surgiram os sites que colocam os currículos online - e hoje já existem muitos deles. Esses sites são serviços para os empregadores, e não para quem procura um trabalho. Eles se propõem casar em poucos dias o perfil dos candidatos com as vagas disponíveis. Só que os números têm mostrado que a coisa não funciona tão bem assim. Uma pesquisa feita em 1998 aponta que no curso de 90 dias um site que continha 40 000 currículos foi visitado por 400 empregadores. No mesmo período, um outro site com 30 000 currículos foi clicado por apenas 15. A proporção é desastrosa. E a situação não mudou no ano passado. É raro um empregador procurar um empregado examinando currículos. Normalmente, eles telefonam para o melhor amigo e perguntam: "Preciso de uma secretária. Você conhece alguém?"

Depois de receber diversos "não", como manter a auto-estima durante a caça ao emprego?

A primeira coisa que afeta sua auto-estima é a expectativa. Tem gente que lida bem com respostas negativas. Outros entram em depressão. Para alguns, essa situação faz tão mal ao ego que a sensação de rejeição continua mesmo quando eles conseguem um emprego.

E quando, depois de tudo isso, ainda se tem um chefe ruim?

Isso piora, pois a pessoa já está vulnerável e mais sensível a insultos. Mas o fato é que você não precisa ter um chefe ruim. Você tem de descobrir isso antes de agarrar o emprego. Procure saber a opinião de outras pessoas que trabalham com ele ou aproveite a sua entrevista para questioná-lo. Existem os "bons chefes ruins", que logo de cara listam o que esperam de você. Mas os "ruins chefes ruins" nunca vão te dizer. Aí você está frito. Retome as suas entrevistas de informação.

Que importância o senhor confere hoje aos testes vocacionais?

Nenhum deles é infalível. Muitos administradores de testes não sabem interpretar os resultados de maneira correta. É preciso saber identificar o que o teste está medindo - quem está à caça de uma carreira ou emprego deve buscar em si quais são as qualidades que gostaria que fossem aplicadas no trabalho. Em seguida, descobrir como usar essas qualidades com o conhecimento. Existem milhares de testes diferentes, inclusive na Internet. Mas é muito difícil encontrar um que meça esses dois aspectos. Na verdade, são os seus interesses que vão determinar o caminho que você vai seguir.

Para que, então, servem esses testes?

Eles são uma boa ferramenta caso você tenha de optar entre duas ofertas de trabalho. Os testes que tratam do seu tipo de personalidade dão uma noção da sua capacidade de adaptação em determinados ambientes de trabalho, mas não são úteis a ponto de indicar uma carreira. Se você me disser apenas que gosta de fazer trabalhos manuais, posso listar uma série de profissões. Mas elas vão variar de pianista a chefe de cozinha. Testes só ajudam se você souber o que está buscando. Eles não funcionam para quem não sabe o que fazer da vida.

O que o senhor aconselharia para os que têm um currículo brilhante, mas pecam na hora da entrevista?

Um artigo recente do San Francisco Chronicle, chamado "O incompetente não tem noção", diz que pessoas com esse perfil não estão abertas a conselhos, pois já se acham maravilhosas. Mas para os que aceitam feedback eu diria duas coisas: numa entrevista, fale 50% do tempo e ouça durante a outra metade. Quem fala muito é tido como auto-centrado e pouco interessado na empresa. Já quem fala pouco parece estar escondendo alguma coisa. O segundo conselho é não levar menos de 20 segundos ou mais de 2 minutos para responder a uma pergunta. Um amigo na França resolveu cronometrar o tempo que seus entrevistados levavam para responder às questões, sem eles saberem. Um deles levou 18 minutos na primeira questão. Meu amigo gravou a resposta, colocou para o candidato escutá-la e disse: "Está vendo por que você não consegue um emprego?"

Há uma crescente onda de "técnicos de carreiras" nos últimos anos nos EUA. Qual a função deles?

Em vez de agirem como "sábios" ou "avós" indicando qual o caminho certo para seus aprendizes, eles fazem com que os candidatos busquem em si soluções para seus problemas ou dificuldades.

Como lidar com a inevitável pressão da família e dos amigos durante a busca de trabalho?

Muita pressão pode prejudicar. Se você tem um objetivo definido, fez o dever de casa como manda o figurino e está esperando por aquela oportunidade única, não há como lidar com a cobrança da família. Ela nunca vai entender o fato de você recusar três ofertas de trabalho por elas não serem o que você procura. É preciso que a família e os amigos estejam a par dos assuntos relevantes para você. Caso contrário, eles o levarão à loucura.

Como nasceu o título do livro?

Quando escrevi a primeira edição do livro, há 30 anos, os americanos usavam a expressão "vou pular de pára-quedas" para dizer que estavam mudando de carreira ou de emprego. Certa vez, numa reunião de trabalho, alguém disse "vou pular", daí perguntei: "qual é a cor do seu pára-quedas?" Todos deram risada. Daí resolvi adotar a frase no título.

E qual é a cor do seu pára-quedas?

Não sei. Nunca levei essa frase a sério...


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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