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Nem todo cliente é importante para as empresas
29.agosto.2006

ALPHA DOGS

Tania Menai, de Nova York


Nunca subestime a pequena loja de biciletas do seu bairro. Talvez, será ela quem lhe ensinará sobre um modelo ímpar de gerenciamento de pequenos negócios. Pelo menos, este é o caso da Zane’s Cycles, em Connecticut, hoje um dos maiores revendedores de bicicletas no país. Com faturamento anual de 6 milhões de dólares, 18 empregados fixos e além dos quase 25 que servem meio-expediente, a loja de Chris Zane, criada em 1981, é um dos grandes negócios descrito do livro Alpha Dogs (Editora Collins, 205 páginas), da jornalista americana Donna Fenn, colaboradora da revista Inc.

Alpha é a primeira letra do alfabeto grego, e também significa primogênito, o primeiro, o líder. Há 20 anos escrevendo sobre empreendedores, Donna, que escreve como se estivesse conversando com o leitor, selecionou oito exemplos que lhe chamaram atenção durante a longa carreira e foi a fundo contar o que fizeram um dono de uma loja de bicleta, a dona de uma sorveteria texana, um fabricante de meias que inovou para não se render à manufatura chinesa ou o herdeiro de uma rede - falida - de mercearias, em casos de sucesso. Na receita, encontram-se ingredientes básicos como serviço ao consumidor, engajamento de funcionários, bom uso da tecnologia, conexões com a comunidade, inovação, branding, alianças e reinvenção. Donna recomenda não competir, mas, sim, diferenciar-se.

O livro mapeia o que aconteceu com os pequenos negócios em meio à Nova Economia, que, segundo o livro, foi mais uma mudança cultural do que econômica: a geração que cresceu na década de 80 já não sabe o que é fazer carreira numa empresa. Estes jovens, são mais familiares com a noção de demissões em massa e star-ups. Donna menciona que nos Estados Unidos, existem 5,7 milhões pequenos negócios – a cada ano, 10% deles (ou cerca de meio milhão) fecham as portas. Um quarto dos negócios não sobrevivem ao segundo ano – e 60% falecem no sexto ano de vida. Ela lembra que hoje, pequenos negócios tem de encarar obstáculos nunca vistos. Consumidores estão cada vez mais educados e, portanto, mais exigentes. Empresas estão se consolidado, tornando os pequenos negócios mais vulneráveis à competição. A tecnologia está, hoje, falando direto com o consumidor – incluindo aquele, que normalmente era cliente de uma pequena empresa. E, certamente, a saturação de mercado dificulta para quem é pequeno e quer aparecer.

Donna conta o caso de um funcionário da Zane’s Cycle, que cometeu um erro – esqueceu de colocar uma bicicleta na vitrine, com balões, escrito “Feliz Dia dos Namorados, Bob.” A namorada de Bob, que desemboslou um bom bocado pela bicicleta, passaria naquela noite na frente da loja para fazer uma surpresa. A decepção foi imensa. Arrependido, ele escreveu uma carta para o dono da loja, Chris Zane, e incluiu um cheque de 400 dólares. Chris – que obviamente não depositou o cheque - diz que este é o grau de engajamento que ele construiu entre sua equipe. E para se retratar, o casal ganhou, entre outras coisas, um jantar no restaurante mais caro da cidade.

Norman Mayne, dono de três supermercados em Ohio, acredita que o cliente não é o mais importante. A prioridade é o funcionário. Na Dorothy Lane Market, empresa fundanda em 1948 e que ele herdou da família, Norman orquestra 250 funcionários e mais 457 que trabalham meio-expediente. Ele gasta 25 mil dólares por ano em treinamento, conduzido diversas vezes por ano. O turn-over entre os que trabalham meio-expediente é de 20% a 30% por ano, um número muito inferior a média de 100% do setor. Ele diz que serviço ao consumir era seu mantra durante anos, até se dar conta que “se um funcionário do Seven Eleven o tratou mal, era porque era assim que ele era tratado pelo chefe.” Dito isso, Donna lembra que ambiente de trabalho está diretamente relacionado à performance financeira. E cita a fonte: o Instituto dos Ótimos Lugares para Trabalhar, que criou a lista das “100 melhores empresas para se trabalhar publicada na revista Fortune.”

A empresa Dancing Deer Baking Company segue o mesmo caminho. “Quando a equipe está feliz, o resultado se vê na comida,” escreve Donna sobre o mantra da empresa de Trish Karter, dona da panificadora de Boston que fatura 5,8 milhões de dólares por ano e conta com 44 funcionários. Por meio de branding, a empresa é conhecida fora de seu mercado local – a marca representa um produto de ingredientes orgânicos, kasher, naturais e sem-preservativos. Eles ainda tem o compromisso de criar empregos num bairro carente da cidade e doar 35% do lucro de uma linha de produtos para caridade. Já para Jim Thorneburg, presidente da Thor.lo Inc, da Carolina do Norte, inovação foi a saída para manter a empresa de meias, criada em 1951. Enquanto um americano gasta em média 3,50 dólares por um par de meias, o consumidor das meias de Jim desembolsam 11 dólares. Isso compensa os milhões gastos em tecnologia para criar e produzir meias que protegem os pés de quem corre e de quem esquia. Ele tem 50 marcas registradas e 20 patentes que evita a cópia de modelos e cores. Jim tem 360 funcionários e um faturamento de 40 milhões por ano.

Outro caso interessante é de Deb Weidenhamer, do Arizona. Deb é CEO da Action Systems Auctioneers & Appraises, que atua na área de leilão, uma prática bem comum nos Estados Unidos, onde a cada primavera, abre-se as portas das garagens para vender as quinquilharias da casa. Quando o e-Bay surgiu, em vez de se apavorar, Deb, cuja empresa fatura hoje 11, 5 milhões de dólares anuais, resolveu oferecer este serviço aos seus clientes. A iniciativa parece óbvia, mas não é bem assim. Trata-se de um setor quase averso ao mundo tecnológico. Apenas 13% das 25 mil empresas de leilão dos EUA – que juntas equivalem a um setor de 217 bilhões de dólares – oferecem leilão online. Para sobreviver, ela diz: “não se pode mais pensar como uma empresa de leilão. Mas como uma empresa de tecnologia.” Ainda assim, Deb abre seu estabelecimento duas ou três vezes por semana para seguir a tradição dos leilões: ao vivo e no grito.

# # #

Thor-lo – Pense como alguém de fora– se Jim continuasse a pensar como quase todos os CEOs de seu setor, ele ainda estaria fazendo meias baratas e se rendido à fabricação chinesa. Opte pela inovação.
Dancing Deer – Pegue seu consumidor pela emoção. Esta é a essência do branding. Crie uma mensagem que faça com que seus consumidores confie na empresa.
Dorothy Lane Market – Contrate os funcionários certos – Um funcionário ruim pode lhe custar até 200% em compensação de mão-de-obra. Não ache que só porque há muitas demissões, estão sobrando bons funcionários no mercado. Escolaridade é importante, mas ética e boa conduta são cruciais.
Zane’s Cycle - Melhore sempore seu desempenho. Fique de olho no que a competição está fazendo – seja ela grande ou pequena. A partir dai, crie alternativas tentadoras não disponiveis na concorrência.
Auction System - Conheça bem a tecnologia – Pesquise bastante e saiba como a tecnologia pode funcionar a seu favor antes de ter de reinventar a roda para lidar com o seu consumidor.


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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