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Para onde foi o subúrbio?
03.maio.2000

Tania Menai, de Nova York

Há um mês o filme Beleza Americana, do diretor inglês Sam Mendes, deixou a festa do Oscar com cinco estatuetas, incluindo a de melhor ator, para Kevin Spacey, e a de melhor filme. O filme revela os bastidores do subúrbio branco americano, aquela vidinha aparentemente sem sal, estilo todo-dia-ela-faz-tudo-sempre-igual. Mas a verdade é que os próprios suburbanos nem se preocuparam em ver o filme. Os "suburbia", como eles chamam, de Beleza Americana estão se tornando coisa do passado.

Os Estados Unidos estão assistindo há mais de uma década a uma grande migração dos estressados das grandes cidades para os subúrbios em busca de mais espaço e tranqüilidade. Essa fuga está agora cobrando o seu preço. "Quem viaja de avião de Boston a Washington pode ver que não há mais regiões verdes dividindo as pequenas cidades dos subúrbios. Hoje tudo virou uma grande cidade", diz Howard Feder, engenheiro de Filadélfia. "Quando nos mudamos para cá, em 1971, o terreno que circundava a minha casa era uma plantação de milho. Isso já era, está tudo asfaltado."

Não é só o aspecto físico que tira o sono dos suburbanos. Junto com o caminhão de mudança, os urbanos estão levando a "atitude" da cidade grande. Já se foi o tempo em que uma vaga de estacionamento era gentilmente cedida ao cidadão do carro ao lado. Quem foi criado em Manhattan não está nem aí para a cortesia e mergulha o pé no acelerador quando vê uma única vaga num shopping. Além disso, não há a mais remota possibilidade de se abrir mão da assinatura do The New York Times, da revista The New Yorker ou de um café do Starbucks logo ali na esquina. Por isso, as empresas estão seguindo os seus consumidores.

É o caso da cadeia de lojas Anthropologie, conhecida em Manhattan por ter uma loja imensa na moderninha West Broadway, no SoHo. Além de vender roupas coloridas, acessórios marroquinos, cabides indianos, tecidos paquistaneses e velas aromáticas, o próprio nome, acadêmico e em francês, já é uma sofisticação para o americano médio que mal consegue pronunciá-lo (e não tem idéia de onde fica o Paquistão). O dono, Glen Senk, 43 anos, que vive hoje nos subúrbios de Filadélfia, diz que seus clientes são "ex-urbanos". A cadeia está expandindo subúrbio adentro. Mas não é em qualquer grama que Glen arma sua barraca. Só nos lugares chiques.

"Existem subúrbios e subúrbios", diz o carioca Marcello Averbug, economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o BID, em Washington, DC. Averbug mora com a família em Potomac, cidade vizinha a Bethesda, ambas em Maryland, a 30 minutos de Washington. "Aqui vivem vários diplomatas e economistas estrangeiros, o que torna a região culturalmente mais interessante. Por isso, existem excelentes restaurantes das mais variadas cozinhas, eventos artísticos, boas livrarias e lojas", diz. Uma parte do centro de Bethesda acaba de ser reconstruída pela empresa Federal Realty e ganhou ares de Greenwich Village. A empresa está fazendo o mesmo nos subúrbios californianos, como San José e San Antonio.

Que os subúrbios americanos já não são mais os mesmos é óbvio a olho nu. Para começar, a imagem de bolsões brancos é coisa do passado. A porcentagem dos negros nestas áreas subiu de 23% em 1970 para 32% em 1990, e mais de 40% dos suburbanos já são membros de minorias. Com tantas mudanças assim, os subúrbios começam a ganhar um novo peso. Segundo o repórter de política da CNN John King, são os suburbanos do centro-oeste, região industrial longe dos embalos da nova economia, que vão definir o páreo duro que estão as eleições presidenciais deste ano.


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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