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Eu, eu mesma, Luana
19.outubro.2000

Ivan Finotti e Tania Menai, de Nova York

“Eu vi ‘Dancer in the Dark’ e quase morri. Chorei muito, saí mal. O filme da Björk abalou minha estrutura enquanto ser humano! Comecei a chorar bem cedo, em um momento lindo em que a Björk está brincando com o filho, e foi um choro compulsivo, daqueles que deixa você feia! Eu sofria chorando, uma coisa horrorosa.”

São palavras da modelo paulista Luana Elídia Afonso Piovani, 24 anos. “Choro compulsivo?” Não seria “convulsivo”? Deixa pra lá. Ela chegou em Nova York há três meses e comprou um apartamento de um quarto na rua 50 entre as Avenidas 10 e 11. Desde setembro, Luana é protagonista de um site que os americanos chamariam de “Me, Myself and I”, onde Nova York é apenas pano de fundo. A intenção de Luana é passar um ano estudando teatro, fazer aulas de inglês no Berlitz, apresentar um programa na MTV e contar para os internautas que se sente “a Marilyn Monroe ao passar Chanel 5 para dormir”.

Mais: “Eu vi a recém-reformada loja da Gucci, que é um sonho. Mas, para a felicidade geral da nação, da minha mãe e da minha conta bancária, eu ainda não comprei nada lá”.

Outra: “Imprevistos de minha aventura americana: no último sábado, a Selma, minha coleguinha goiana que me ajuda a tomar conta da minha casa, estava comigo na cozinha. Ela foi começar a lavar a louça, quando eu sugeri de colocarmos na máquina. Mas quando eu abri, tive a desagradável surpresa de ver a minha máquina cheia de uma água preta, gosmenta e com um cheiro insuportável (...) Foi horrível conviver com aquela máquina de lavar louça imunda, fedendo a gambá!”

O site de Luana Piovani faz o gênero No Limite, com “água preta, gosmenta” mas sem olho de cabra porque o cenário do voyeurismo é Nova York. Trata-se de uma sucessão de casualidades elevadas à categoria de informação íntima e exclusiva. A idéia pode ser boa, mas no caso de Luana virou problema. Luana é uma mulher corajosa. Podia ser uma Ana Paula Arósio da vida, não fosse seu espírito rebelde e independente que a tirou da Globo e a levou para a MTV. Mas Luana não é uma artista formada e por enquanto, tem muito mais a mostrar do que a dizer. O que o site escancara é o diário vazio e previsível de uma das mulheres mais desejadas do Brasil.

Em todo caso, funciona bem, comercialmente falando. Corre no mercado que a modelo tenha embolsado entre 150 mil e 200 mil reais para trocar o portal Zip.Net pelo Terra, em agosto. Além disso, estima-se um salário de cerca de 10 mil reais e porcentagem de venda dos banners de publicidade.

Luana em Nova York também pode ser vista pela MTV. A estréia do programa semanal, chamado “Tudo de Bom”, aconteceu na quinta passada. O formato inclui entrevistas com pessoas que vivem em Nova York e novidades sobre a cidade. A produção conta com uma equipe de quatro pessoas em Nova York. Segundo Mônica Rogozinski, a produtora executiva, a gravação com a modelo é feita duas vezes por semana e as pautas são criadas pela própria Mônica junto com a diretora, Paula Chrispiniano, e a assistente de direção. “Alguns dos entrevistados a Luana nunca ouviu falar, mas damos todas as diretrizes a ela”, diz Mônica. “Ela é bastante espontânea e pouco exigente, o que facilita o trabalho”, acrescenta.

A modelo faz ginástica todas as manhãs, duas horas por dia. Mas nas aulas de teatro, a grande razão anunciada de sua vida no exterior, Luana tem ido só quando dá. É que são muitos os compromissos no Brasil. No início desta semana, por exemplo, ela chegou ao Rio de Janeiro para o lançamento de um calendário de fotos e volta a Nova Iorque apenas na próxima segunda-feira. “Ela foi embora, mas tem vindo quase todo fim de semana para trabalhos na publicidade”, diz seu empresário Márcio Damasceno, que fechou campanhas realizadas no Brasil para marcas como Sprite e Johnson & Johnson durante essa temporada nova-iorquina. “Para mim não mudou nada. A única diferença é que pago interurbano para falar com ela.” Mudou um pouco para os clientes, que, agora, além do cachê no patamar dos 100 mil reais (dependendo do tipo de campanha), têm que bancar passagem de primeira classe ou “pelo menos executiva” para a modelo.

Para aprender a interpretar, Luana escolheu uma técnica chamada Processo Criativo Orgânico, “baseado nas leis naturais da criatividade”. O professor de não é qualquer um. É John Strasberg, filho do respeitadíssimo Lee Strasberg, que fundou o Actor´s Studio, lendária escola de teatro por onde passaram Marlon Brando e James Dean. A modelo fornece em seu site informações do curso: “Nem conto para vocês que as minhas aulas de teatro estão começando. Minha vida continua uma correria (tudo de bom!) e o meu fofo professor John só me recomendou seis livros...! Que tal seis livros de teatro clássico em inglês?! Vocês já leram? Pois é... nem eu. Mas não tem nada não, ele falou que, já que não tenho pressa, dá para ir devagar... How sweet!”

Já as prometidas web câmeras do Luana.NY, que deveriam ser um chamariz de adolescentes ao focalizar ao vivo o apartamento da modelo, não têm funcionado direito. Esta semana, problemas técnicos nos cabos deixaram o serviço fora do ar. Mas a seção de fotos está lá. Não espere muito de Nova York, mas em compensação pode-se ver Luana apresentando o novo sofá que finalmente chegou à sua casa. Pode-se ver Luana de mochila escolar em frente à sua escola de inglês. Pode-se ver Luana abraçada com os reis do mambo Gipsy Kings. Luana experimentando bolo de aniversário. Luana mostrando sua calça jeans rasgada. Lavando liquidificador na cozinha. Exibindo sua nova echarpe. Com um periquito no colo. Esperando um táxi na calçada. De ressaca. Há até fotos de Luana de toalha teclando no computador. Mas sem toalha não tem.


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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