A caipirinha dos sarados
28.agosto.2001
Tania Menai
No bom e velho Aurélio lê-se que ‘açaí’ ou ‘açaí-do-pará’ é uma “palmeira de cujos frutos se faz uma espécie de papa muito apreciada”. Aprende-se ainda que, em tupi, açaí quer dizer “fruta que chora” e que seu refresco é conhecido como juçara. O que não consta é a nova grafia da palavra: “ah-say-ee”. Pelo menos é desta forma que o paulistano André Doria, 29 anos, há sete anos vivendo nos Estados Unidos, tem apresentado a fruta aos americanos. “Na hora de ensiná-los a pronúncia, não tenho outra saída”, diz ele, que mora em Nova York. Para os americanos, tão exótico quanto a fruta é a sua grafia, com o cedilha. “Pensamos em divulgar o nome com ‘dois esses’ – mas, em inglês, não pegaria muito bem, se é que você me entende”.
Dono da importadora Nectar Brazy, André é o pioneiro em trazer a polpa de açaí para os EUA. Há um ano, a fruta pipoca nos menus dos restaurantes brasileiros, casas de frutas e, principalmente, nas academias de Nova York – entre elas, a Chelsea Piers, Equinox e Reebok. “A primeira remessa de açaí chegou para a festa de Sete de Setembro, que acontece nas ruas da cidade”, lembra André. “Na época, importamos 500 quilos. A aceitação tem sido tão boa que este mês, estamos preparando o primeiro container de nove toneladas”, comemora ele, lembrando que a empresa não recebe auxílio do governo brasileiro. “Buscamos apoio do setor privado para viabilizar o nosso projeto”, diz ele. “Não prentendo limitar a venda das polpas para a comunidade brasileira daqui. O objetivo é fazer com que o açaí seja o drink do momento nos Estados Unidos – a fruta tem uma cor exótica (roxa), além de ser ultra nutritiva. Esta é uma combinação perfeita para conquistar o mercado americano”, conta ele, que é campeão de pólo aquático e membro do NewYork Athletic Club, o clube que mais envia jogadores para as olimpíadas em esportes amadores.
Tudo começou em 1994, na esquina da rua José Linhares com Ataulfo de Paiva, no Leblon. “Experimentei uma taça de açaí no Bibi Sucos, o point dos lutadores cariocas de jiu-jitsu”, lembra ele, sentado em outra esquina, a da rua 59 com Columbus, no Starbucks. “Não gostei de primeira. Mas um amigo americano adorou - isso foi um grande incentivo para começar a importar a fruta”, diz ele.
O açaí é energético e rico em antocianinas, antioxidantes que beneficiam a coordenação motora, a memória e a vista, além de ajudar a manter um baixo nível de colesterol e prevenir alguns tipos de câncer. Com tantas qualidades, é popular como alimento saudável, embora muito calórico. Mas no Rio de Janeiro hoje é identificado com um grupo de esportistas: os lutadores de jiu-jitsu. Não há um deles que não tome a sua mamadeira diária de açaí. O que esta arte marcial tem a ver com a fruta? Nada. Mas todos eles são seguidores de Carlos Gracie, da tradicional família de lutadores. Foi ele quem trouxe a mania do Pará para o litoral carioca. “No Rio, o boca-a-boca é sempre o melhor marketing”, diz André. “Em Nova York a história é outra.”
Importadas do Pará, as polpas já chegam nos EUA misturadas com xarope de guaraná, o toque adocicado sem o qual os americanos não vivem. “Criamos esta combinação especialmente para eles. Chama-se Açaí Mix.”
Mas nada conquista mais os consumidores do que o slogan do negócio: “Açaí, o Viagra da Amazônia”. “Os índios comem açaí desde a infância”, conta ele, que passou uma temporada no Pará para conhecer a indústria da fruta. André conta que os meninos vão em dupla para a colheita de açaí. “Um sobe na palmeira, e arranca os cachos – que parecem com os de uvas - e joga-os para o outro menino que aguarda no chão.” Os cestos para transporte da fruta são feitos de folhas das próprias palmeiras. Às quatro da manhã do dia seguinte, o açaí é vendido no Ver-o-peso, um mercado gigante onde se encontram todos os tipos de frutas. Por que tanta pressa? “Se não for processado, o açaí estraga em dois dias”, explica André. O que impressiona é que apenas 10% do açaí é feito de polpa – o resto é caroço.
No Brasil, o açaí é em geral consumido puro. No badalado Bibi Sucos, acrescenta-se guaraná e granola. No Pará, é servido como feijão: come-se com farinha e acompanhando refeições. Mas em Nova York, o “ah-say-ee” está ganhando novas receitas. Há quem misture com iogurte, outros servem como sobremesa, acompanhado por outras frutas ou transformam em ‘smoothies’, batendo a polpa com frozen yogurt, sorvete ou gelo ralado. Numa casa de sucos nova-iorquina, uma bebida dessas custa em média sete dólares. Com esse dinheiro faz-se a festa no Leblon. Mas, comparado ao Viagra, cuja caixa de 30 unidades pode chegar a 425 dólares, até que o custo-benefício é positivo.
[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
---
voltar |