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Crença de outra galáxia
23.julho.2005
Criada por um autor de ficção científica
e auto-ajuda, a Igreja da Cientologia é
a fé das celebridades
Tania Menai, de Los Angeles
Há quem não coloque a mão no fogo pela paixão de Tom Cruise pela atriz Katie Holmes. Mas de seu fanatismo pela Igreja de Cientologia, ninguém duvida. O ator de 43 anos é o mais famoso adepto da religião fundada na década de 50 pelo escritor de ficção científica L. Ron Hubbard, (1911-86), e que tem ganho cada vez mais afortunadas estrelas hollywoodianas e ao mesmo tempo levado centenas, talvez milhares, de mortais à falência. Mais parecido com roteiro de quinta categoria do que aceita mundialmente como fé, em 1983 onze líderes religiosos, incluindo a esposa de Hubbard, foram presos por conspiração.
Escritor de ficção científica, Hubbard criou sua religiõa a partir do livro Dianética, um nova filosofia de saúde mental, que diz que tudo o acontece acontece de ruim em nossas vidas fica arquivado em nossa mente reativa. Se não nos livrarmos desta mente reativa, ele nos causará danos futuros, como depressão e qualquer outra falta de controle emocional. Cientólogos afirmam que o livro foi best-seller durarante quatro décadas. Investigações apontam, porém, que a própria igreja comprava o livro em grandes quantidades para mantê-lo sempre na lista dos mais vendidos do jornal New York Times. Opositores de carteirinha à indústria farmacêutica e aos uso de remédios como Prozac e Zolof, principalmente em crianças, fiéis dizem usar as técnicas de Hubbar para qualquer dilema existencial. A igreja também se opõe ferrenhamente aos ensinamentos freudianos e a qualquer técnica da psquiatria ou psicanálise. “Muitas crianças são diagnosticadas precariamente durante a infância e crescem com rótulos que as prejudicam”, diz Lee Anne DeVette, irmã mais velha de Tom Cruise, também cientóloga.
Alguns conceitos, se escutados com superficialidade – como o combate ao uso excessivo de anti-depressivos em milhares de escolas nos EUA e o exagero como crianças são diagnosticadas como hiperativas - fariam sentido não fosse os aspecto de fanatsimo e lavagem cerebral. Tom Cruise chegou a condenar a atriz Brooke Shields, em público, por ter usados drogas como estas para curar sua depressão pós-parto. Em contrapartida, a autópsia do próprio Hubbard, morto após um derrame cerebral, indicou alta dosagem de Vistaril, remédio para acalmar tensão e ansiedade.
Uma das maneiras de a religião ganhar adeptos é o uso do E-meter, um aparelho criado por Hubbard, que utiliza o galvanômetro (tecnologia também usada em detectores de mentiras) para medir o estresse. O usuário segura duas barras de ferro ligadas ao aparelho. Ao detectar pensamentos estressantes, o ponteiro do E-Meter vai para a direita. Caso contrário, vai para esquerda. O mesmo teste é aplicado diariamente em passantes desavisados da estação de metrô da Times Square, em Manhattan, onde circulam cerca de 167 mil pessoas por dia, fazendo daquele um dos lugares mais estressantes da cidade. Em Nova York, a igreja fica em pleno burburinho dos teatros da Browadway, epicentro turístico da cidade, onde se encontra de tudo, menos alguém zen.
Uma vez fisgados, Hubbard criou uma série de estágios os quais seus seguidores devem seguir ao longo dos anos por meio de sessões indoviduais com “auditores”. O primeiro passo é a desintoxicação química do corpo. A cada passo, os fiéis desembolsam mais e mais dinheiro. “O pacote pode variar de 20 a milhares de dólares”, explica uma seguidora francesa. Por estas e outras, proliferam-se histórias de gente que teve de vender a própria casa, ou episódios mais trágicos como o do jovem americano Noah Lottick, que cometeu suicídio aos 24 anos. Mergulhou do décimo andar de um hotel de Nova York sobre uma limosine, segurando 171 dólares em suas mãos – esta foi toda a quantia que lhe restou depois de doar sua conta bancária à igreja.
Além de usar usar uma comunicação visual tão futurista e cósmica quanto a de Star Wars, a cruz estampada na logomarca da religião não tem a ver com o cristianismo. Eles dizem acreditarem em um deus único e invisível. Ainda assim, o aspecto religioso da cientologia – que está mais para auto-ajuda do que qualquer outra coisa - sempre foi duvidoso. Abominada em vários países europeus, principalmente na Alemanha, e com presença tímida no Brasil, em 1967, a cientologia foi isenta de impostos nos EUA. Mas em 1971, a tribunal federeal dos país ditou que os apelos médicos de Hubbard eram falsos e que o E-meter não era um tratamento científico. Hubbard reagiu, fazendo com que toda esta técnica fosse chamada de religião – seus seguidores passaram a usar colarinhos como padres, suas franquias foram batizadas de “missões” e o pagamento dos fiéis ganhou o nome de “doações fixas”. Um de seus livros sobre cosmologia também ganhou aspecto de santidade – passou a chamar “escrituras sagradas”, que, juntamente com DVDs, podem ser adquiridos na loja dentro da Celebrity Church, pelas diversas missões, pelo telefone e internet.
Tom Cruise descubriu esta igreja logo que mudou-se para Los Angeles, no começo de sua carreira. Considerado disléxico durante a infância e a adolescência (sua família mudou-se 15 vezes de cidade durante seus priemeiros quinze anos de vida, obviamente prejudicando seu rendimento escolar), ele diz que é errado rotular crianças de qualquer doença psicológica. Segundo ele, apenas a cientologia lhe garantiu que dislexia não fazia parte de sua vida. “Sou interessado em Direitos Humanos e fazer com que as pessoas saibam quais são eles e que saibam celebrar as diferenças”, disse ele a Veja. Depois de ter contratado a própria a irmã como assessora de imprensa, hoje, qualquer jornalista que deseja entrevistar o ator, deve participar de um tour de cinco horas ininterruptas pelos estabelecimentos da cientologia. “A imprensa mundial tem mal-interpretado a religião, por isso nosso dever é explicar e tirar todas as dúvidas”, diz ela, que age independente dos estúdios de cinema. O tour, feito de dois em dois jornalistas, é marcado com antecedência e feito um dia antes da entrevista “para que os jornalistas já saibam sobre a religião antes de falar com Tom”, explica Lee Anne a Veja.
A incursão começa no Celebrity International Center, a sede mundial da religião, em Hollywood. Com ares de palacete, a mansão foi construída em 1929 para abrigar o hotel Chateau Elysée que hospedava as estrelas de cinema da época. Uma vez transformada em centro para sua religião, a mansão incluída uma sala usada por Hubbard, autor de dezenas de livros, “Tudo o que é novo tende a ser atacado. Esta religião tem pouco mais de cinqüenta anos e não pára de crescer”, diz Lee Anne, sempre cortês e simpática. “Claro que isso choca muita gente”. Ela assiste repetitivamente junto com os convidados um DVD que mostra o discurso do principal ministro da religião, David Miscavige, um sujeito de 44 anos, extremamente bem articulado. Formado pela segunda geração da religião, ele discursa para a platéia de 2 mil endinheirados que compareceram a festa da gala no Celebrity Center, que comemorou os 35 anos da religião.
Com ares e cenário de entregador de Oscar, Miscavige diz que a religião está presente em 150 países, fala da importância da educação, da filantropia, dos direitos humanos, de trabalhos em cadeias (chamados de criminon), da guerra declarada que a cientologia tem contra a indústria farmacêutica e às drogas ilícitas (o que eles chamam de narconon). A igreja de cientologia chegou a criar 137 centros de reabilitação de narcóticos em 37 países, incluindo o Brasil. Miscavige ressalta ainda problemas como o analfabetismo e a imoralidade – e é tão abrangente que, além de apelar diversas vezes aos atentados de 11 de setembro, ele cita fatos que vão de pirataria de computadores a porcentagem de crianças que colam nas provas. “As pessoas são ensinadas a odiar. Por isso é muito importante educar, falar, escutar. O que me interessa hoje é ajudar e mudar esta sociedade que, sem dúvida, está em declínio”, diz Tom Cruise. O que isso tem a ver com uma religião como esta? Freud, certamente, não explica. E mesmo se tentasse, não seria ouvido.
Para saber mais
* A palavra Cientologia vem dos termos latinos scio, conhecer, e logos, razão.
* Para a cientologia, a mente é um sistema de comunicação e controle entre pessoas e seu ambiente. Ela é composta por imagens de experiências passadas. O indivíduo ultiliza a mente para problemas relacionados à sobrevivência – característica comum entre todos os humanos, aspecto reforçado por esta religião.
* A cientologia acredita que a única fonte de problemas como estresse, ansiedade, depressão, agressão, atitudes irracionais e pensamento negativo chama-se mente reativa, ou uma parte da mente que arquiva todas as experiências ruins vividas pelo indivíduo e as usa contra a própria pessoa. O indivíduo não tem controle sobre a mente reativa.
* A religião é contra o uso de qualquer remédio anti-depressivo, calmantes ou afins. Também vai na contramão de cientistas como Freud e a psicanálise. Para se livrar da mente reativa, L. Ron Hubbard criou a Dianética, uma tecnologia espiritual que descobre a fonte do pensamento e sensações negativas.
• Os seguidores desta religiões participam de sessões individuais com auditores, pessoas treinadas que seguem passo-a-passo da técnica de Hubbard. O livro de auto-ajuda “Dianética” , escrito por ele em 1950, foi best-seller durante quatro décadas. A religião é acusada de mandar seguidores em massa comprar os livros, para que ele se mantivesse na lista dos mais vendidos.
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[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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